— Adolf Hitler! Ken, isso deixa-me furiosa! Morrem quarenta milhões de pessoas para derrotar esse megalomaníaco, e ele é a estrela da primeira transmissão para outra civilização? Ele está a representar-nos. E a eles. o sonho mais desvairado desse louco tornado realidade.
Fez uma pausa e continuou em voz mais calma:
— Sabe, nunca achei que Hitler soubesse fazer aquela saudação hitleriana. Nunca saía direita, desviava-se sempre para algum ângulo excêntrico. E depois havia aquela saudação maluca de cotovelo dobrado. Se alguém tivesse feito os seus heil hitlers tão incompetentemente, teria sido mandado para a frente russa.
— Mas não há uma diferença? Ele estava apenas a retribuir as saudações dos outros. Não estava a saudar Hitler.
— Oh, estava, sim! — replicou a presidente, que, com um gesto, dirigiu Der Heer para fora da Sala Rosa e por um corredor fora. De súbito parou e olhou para o seu conselheiro científico. — E se os nazis não tivessem tido televisão em 1936? Que teria acontecido?
— Bem, nesse caso suponho que poderia ter sido a coroação de Jorge VI, ou uma das transmissões acerca da Feira Mundial de Nova Iorque de 1939, se alguma delas tivesse sido suficientemente potente para ser recebida em Vega. Ou alguns programas dos fins dos anos quarenta, princípios dos cinqüenta. Sabe a que me refiro, Howdy Doody, Milton Berle e as audiências Exército-McCarchy… todos esses maravilhosos sinais de vida inteligente na Terra.
— Esses malditos programas são os nossos embaixadores no espaço… o emissário da Terra. — Fez uma pausa, a saborear a frase. — Com um embaixador devemos apresentar a nossa melhor faceta, e há quarenta anos que nós estamos a enviar principalmente porcaria para o espaço. Gostaria de ver os executivos das cadeias de televisão desenrascarem-se com esta. E quanto àquele maluco do Hitler, foi essa a primeira notícia que receberam da Terra? Que vão pensar de nós?
Quando Der Heer e a presidente entraram na sala do Gabinete, os que tinham estado de pé em pequenos grupos calaram-se e alguns que estavam sentados fizeram menção de se levantar. Com um gesto natural, a presidente manifestou a sua preferência pela informalidade e, despreocupadamente, cumprimentou o secretário de Estado e um secretário da Defesa adjunto. Percorreu o grupo com uma volta lenta e deliberada da cabeça. Alguns retribuíram-lhe o olhar, na expectativa. Outros, detectando uma expressão de pequena irritação no rosto da presidente, desviaram os olhos.
— Ken, essa sua astrônoma não está aqui? Arrowsmith? Arrowroot?
— Arroway, senhora Presidente. Ela e o doutor Valerian chegaram a noite passada. Talvez o trânsito os tenha atrasado.
— A doutora Arroway telefonou do seu hotel, senhora Presidente — informou um homem novo, meticulosamente vestido. — Disse que estavam a chegar alguns dados novos através do seu telefax e que queria trazê-los para esta reunião. Devemos começar sem ela.
Michael Kitz inclinou-se para a frente e perguntou, num tom de voz e com uma expressão de incredulidade:
— Estão a transmitir dados novos sobre este assunto através de um telefone normal, inseguro, num quarto de hotel de Washington?
Der Heer respondeu tão suavemente que Kitz teve de se inclinar ainda mais para a frente para o ouvir:
— Mike, acho que há pelo menos codificação comercial no telefax dela. Lembre-se, no entanto, de que não estão estabelecidas nenhumas linhas de orientação para este assunto. Tenho a certeza de que a doutora Arroway se mostrará cooperante se tais linhas forem estabelecidas.
— Muito bem, comecemos — disse a presidente. — Esta é uma reunião informal conjunta do National Security Council e do que, por enquanto, chamamos Grupo de Trabalho de Contingência Especial. Desejo frisar a todos que nada do que for dito nesta sala — repito, nada — deverá ser discutido seja com quem for que não esteja aqui, excetuando o secretário da Defesa e o vice-presidente, que se encontram no estrangeiro. Ontem, o doutor Der Heer pôs a maior parte dos senhores ao corrente deste incrível programa de televisão da estrela Vega. É opinião do doutor Der Heer e de outros — olhou à volta da mesa — que foi apenas uma casualidade o fato de o primeiro programa de televisão a chegar a Vega ter tido como estrela Adolf Hitler. Mas é… um embaraço. Pedi ao diretor da Central Intelligence que preparasse uma avaliação de quaisquer implicações de segurança nacional em tudo isto. Há alguma ameaça direta de quem diabo está a enviar isto? Vamos ficar em apuros se houver alguma nova mensagem e algum outro país a decifrar primeiro? Mas, antes de mais nada, deixe-me perguntar-lhe, Marvin, se isto tem alguma coisa a ver com discos voadores.
O diretor da Central Intelligence, um homem autoritário no fim da meia-idade, de óculos de aros de aço, resumiu: objetos voadores não identificados, conhecidos por OVNis, tinham sido uma preocupação intermitente para a CIA e a Força Aérea, especialmente nos anos cinqüenta e sessenta, em parte por boatos a respeito deles poderem constituir um meio e uma potência hostil espalhar a confusão ou sobrecarregar os canais de comunicação. Verificou-se que alguns dos incidentes representados por meios mais dignos de crédito foram, na realidade, penetrações do espaço aéreo dos EUA ou sobrevôos de bases norte-americanas no estrangeiro por aeronaves de alta performance da União Soviética ou de Cuba. Tais sobrevôos são um meio comum de testar o estado de prontidão de um adversário potencial, e os Estados Unidos da América tinham efetuado mais do que o seu justo quinhão de penetrações, e simulações de penetração, do espaço aéreo soviético. Um Mig cubano que penetrasse duzentos milhas acima da baía do Mississipi antes de ser detectado era considerado publicidade indesejável pelo NORAD. O procedimento rotineiro da Força Aérea tinha sido negar que alguns dos seus aparelhos tivessem estado nas imediações do lugar onde o OVNI fora avistado e não dizer nada acerca de penetrações não autorizadas, solidificando assim a mistificação do público. Ao ouvir estas explicações, o chefe do Estado-Maior da Força Aérea pareceu marginalmente embaraçado, mas não disse nada.
A grande maioria dos OVNis reportados, continuou o D.C.I, era constituída por objetos naturais mal identificados pelo observador. Aeronaves não convencionais ou experimentais, faróis de automóveis refletidos de céu nublado, balões, aves, insetos luminescentes e até planetas e estrelas vistos em condições atmosféricas fora do vulgar, todas essas coisas tinham sido reportadas como OVNIs. Verificou-se que um número significativo de informações se devia a brincadeiras ou a genuínas ilusões psiquiátricas. Tinham sido comunicados mais de um milhão de avistamentos de OVNIs em todo o mundo desde que a expressão «disco voador» fora inventada, no fim dos anos quarenta, e nenhum deles parecia revestir-se de boas provas que permitissem relacioná-lo com uma visita extraterrestre. Mas a idéia engendrava emoções fortes e havia grupos e publicações marginais, e até alguns cientistas acadêmicos, que mantinham viva a suposta relação entre OVNIs e vida noutros mundos. Recente doutrina quiliasta incluía a sua parte de redentores extraterrestres que viriam em discos voadores. A investigação oficial da Força Aérea, chamada, numa das suas últimas encarnações, Projeto Livro Azul, tinha sido encerrada nos anos sessenta por falta de progresso, embora tivesse sido mantido um interesse continuado, a um nível menos elevado, conjuntamente pela Força Aérea e pela CIA. A comunidade científica estava tão convencida de que não havia nada no caso que, quando Jimmy Carter pedira à National Aeronautics and Space Administration que procedesse a um estudo amplo dos OVNIs, a NASA, contra o que era habitual, recusara um pedido presidencial.
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