A estrela sem nome estabilizava-se. A sua superfície ainda se agitava em ondas chamejantes de vez em quando, mas não aumentou mais. Passamos para o ahun, para a viagem de regresso.
Logo que Ella apareceu, Souilik, pelas ondas, lançou a nova. Assim, mesmo antes de atingirmos a atmosfera, fomos rodeados por uma escolta triunfal de centenas de ksills e pelo Tsalan. Quando amerrissamos no extremo do embarcadouro, todo o Conselho dos Sábios nos aguardava. E, lá ao fundo, três formas verticais agitavam os braços: Ulna, Essine e Beichit. A praia, a esplanada inferior, as vertentes das montanhas, estavam cobertas de uma multidão de Hiss — única multidão que jamais vi sobre este feliz planeta. Quando surgimos na carapaça do Sswinss rompeu, como uma trovoada, o hino que eu ouvira na sala do Conselho dos Mundos, no planeta Réssan. Era o canto de libertação de centenas de humanidades libertas das ameaças da Grande Noite e para as quais se abria um destino sem limites.
Penetramos na sala do Conselho, alquebrados pela fadiga e pela emoção. Souilik começou a fazer o seu relatório. Azzlem interrompeu docemente: — Não, Souilik, não. Os pormenores técnicos ficam para.amanhã. Hoje conte simplesmente como tudo se passou.
Cada um de nós fez um relato. Sob o domínio da emoção, eu soube encontrar as palavras necessárias para dar parte das minhas angústias, quando segurei o moderador e os segundos se escoavam tão depressa, ali, na superfície daquele sol morto. Sugeri a instalação de uma grua no Ssunnss. Fui ouvido como nunca o tinha sido na minha vida.
Depois parti com Ulna para casa. Fiquei oito dias completos em repouso, Souilik e Essine, Beichit e Séfer foram me ver. Os vizinhos também me visitaram e até Hiss que habitavam longe e que eu nunca vira. Relatei um número incalculável de vezes a nossa aventura. Na noite do oitavo dia, quando regressava do banho, um réob azul, a cor do Conselho, aterrou diante da minha casa. Assza, descendo dele, me disse simplesmente: — Slair, o segundo kilsim está pronto!
Começou então para mim a parte mais fantástica da minha vida. O plano dos Hiss era fazer, na Galáxia Maldita, uma mancha de luz, torpedeando sistemáticamente todos os sóis mortos nos arredores do primeiro que tínhamos reacendido. Assim, fiz parte de uma dezena de expedições, sem incidentes. A peça móvel era agora erguida por uma grua e o meu trabalho consistia apenas em manobrá-Ia. Por acordo tácito, os meus companheiros, tanto Hiss como Sinzus ou Hr'ben, deixaram para mim essa honra, se bem que com a ajuda da grua até uma mulher executaria a tarefa. De resto, as mulheres começaram a participar nas expedições de guerra nos planetas colonizados pelos Milsliks.
Em Marte as fábricas trabalhavam em cheio para construir outros ksills gigantes. A partir da quarta expedição saímos aos grupos de três. Na décima figuraram sete ksills — e sete sóis reacenderam-se simultaneamente Na décima primeira fomos. dez, mas,apenas cinco regressaram!
Me recordarei sempre disso. Tínhamos torpedeado um enorme sol e, apesar de os campos anti-gravíticos estarem no máximo, conseguimos sobreviver, partindo a tempo. Um Hiss da tripulação aproximou-se imprudentemente do extremo do círculo e, como o campo estava enfraquecido nos bordos, o nosso companheiro caiu sobre a superfície do sol morto, perecendo ingloriamente, sem que lhe pudéssemos valer, esmagado pelo seu próprio peso.
Erramos pelo Espaço, aguardando a explosão. A escuridão era completa. Na verdade, como o nosso primeiro torpedeamento remontava a pouco mais de seis meses, a luz de qualquer sol não tinha ainda atingido mais de seis meses-luz. E estes sóis. mortos estavam separados, em média, por distâncias dez vezes. maiores. Eu estava no séall, com Souilik, Ulna e Essine. Esta estava triste: o Hiss que tinha perecido, e cujo corpo ia ser pulverizado pela medonha explosão, era seu parente.
Permanecemos calados. O homem de vigia aos registradores entoava a sua monótona litania: «Sikan, snik. Tsénan, snik. Ojan; snik….
De repente vimo-lo debruçar-se, perscrutar um registador:
«Asénan mislik: sen, tsi, séron, stell, sidon…».
O registo das irradiações Milsliks acabava de passar de O a 5. Para os Hiss o perigo começava a 7 e para os hr'ben a 6! Havia Milsliks na vizinhança, longe de qualquer planeta E isto era, em si mesmo, um perigo e uma ameaça.
No entanto, desta vez nada se passou — nada para nós. A irradiação decresceu.
Alguns minutos depois fomos alcançados pela onda luminosa. O kilsim tinha funcionado uma vez mais.
Passando para o ahun, pousamos no planeta dos kaïens, que nos servia de quartel-general. Um outro ksill gigante, que era comandado por Akéion, já lá estava.
De um dos lados do imenso campo de aterragem tinha nascido uma pequena cidade cosmopolita, que abrigava as equipes encarregadas da conservação dos ksills. Os kaïens mostravam-se amistosos, mas reservados.
Esperamos. Dois outros ksills e os meus comandantes vieram fazer os relatórios.
Tudo era normal. Cerca de cinquenta sóis já tinham sido reacendidos, mas, como observou Beichit, isso era apenas um fraco brilho na noite, em relação aos milhares de estrelas mortas das Galáxias Malditas.
O tempo passou. A noite caiu, a noite de Sswft. Os seis outros ksills não regressavam. Não ficamos muito inquietos, visto que o limite de tempo ainda não fora atingido. Jantamos e fomos dormir. De manhã os quatro enormes corpos dos nossos ksills ainda estavam sozinhos no terreno.
Lá para o meio da manhã pousou um pequeno ksill proveniente de Ella. Conduzia Assza. A sua visita fez-nos parecer o tempo mais curto. Mas quando, da noite, nenhum dos engenhos tinha ainda regressado, a inquietação começou a nos atormentar. De comum acordo, decidimos que Souilik, Assza e eu velaríamos.até de madrugada.
Nos instalamos no penúltimo andar da torre de controle, onde os Hiss tinham instalado um posto de vigia. Por cima das nossas cabeças ouvíamos os pesados passos do kaïen que assegurava o tráfego das aeronaves do seu próprio mundo.
Assza sentou-se diante do posto emissor e tentou entrar em contacto com os ksills no momento de sua aproximação do planeta, Mas tantos aparelhos de ondas sness como os de ondas hertzianas continuavam silenciosos. Cerca da meia-noite Souilik tomou o seu lugar..Sentado num confortável divã, eu adormecia lentamente. Tudo estava obscuro, salvo a fraca claridade verde das lâmpadas de controle De repente apareceu no écran o rosto lívido de um Hiss, Brissan, o comandante do ksill n° 8. Pronunciou algumas palavras entrecortadas e ininteligíveis, após o que o écran se apagou.
Completamente desperto, me levantei e me coloquei atrás de Souilik, que manobrava febrilmente os botões de controle O écran iluminou-se mais uma vez, mas continuou branco.
— Que se passa, Souilik? — perguntei.
— Não sei. Nada de bom, certamente.
— Vamos — interrompeu Assza.
Corremos ao andar superior. Nos olhos pedunculados do kaïen surgiu um clarão de hostilidade quando nos viu entrar, mas que desapareceu quando reconheceu Souilik.
A pedido de Assza, pôs a funcionar o detetor espacial — de resto, um modelo sinzu aperfeiçoado — e sondou o céu. Este detetor é uma espécie de radar, utilizando as ondas sness. No écran surgiu uma mancha que se deslocava rapidamente — O n° 8 — exclamou Souilik. — Estará aqui dentro de alguns minutos. Deve estar já na atmosfera.
Voltamos a descer. Um a um, os potentes projetores acendiam-se nos quatro cantos do terreno, não para o ksill, que deles não precisava, mas para uma astronave kaïen que regressava de uma viagem interplanetária. Chegou pouco depois, enorme massa ovoide e deselegante. Mal se tinha imobilizado, surgiu o nosso ksill. Mas, em vez de descer verticalmente, caía obliquamente para o solo. Com o rosto tenso, Souilik olhava através do vidro.
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