—Por que teria dito isso? Como podia saber que eu seria uma menina?
—Parecia ter certeza.
Enquanto falava, Emilie lembrou-se dos olhos sofridos de Alice, quando lhe pediu:
—Não quero que conte a ele! Jure sobre a Bíblia que não dirá a ele que vou ter um filho.
Lembrou-se do tom da voz de Alice: nervoso, amedrontado. Lembrou-se do rosto pálido e assustado. Teria prometido tudo, naquele momento, só para acalmar o sofrimento da irmã.
Mas depois se arrependeu amargamente do juramento feito sobre a Bíblia. Mesmo no fim, quando Alice já estava desenganada pelos médicos, o pedido foi o mesmo:
—Prometa que não dirá nada a ele sobre Mistral.
Emilie ajoelhou-se, chorando, ao lado da cama. E prometeu novamente. Mas, depois que a irmã morreu e levaram o corpo para o cemitério, teria dado tudo para se libertar daquela promessa.
Queria ter partido para o Mônaco, para enfrentar o Grão-Duque com a verdade. Acusá-lo de assassinato, mostrar a ele a menina órfã, ter a satisfação de denunciá-lo como sedutor e traidor.
Mas manteve a promessa; primeiro, por causa de sua religião, e também porque amava Alice e era muito supersticiosa. Não poderia quebrar um juramento feito três vezes. Era um voto tão sagrado como as lembranças da irmã.
Um dia, jurou a si mesma fazer o Grão-Duque sofrer o que tinha feito Alice e ela sofrerem.
Durante longas noites, lutou para salvar a vida de Mistral, dando remédios, quando a criança acordava gritando, e ninando-a no calor da cozinha até o amanhecer. Enquanto isso, pouco a pouco, um plano se formou em sua mente. Um plano que levaria longos anos para ser colocado em prática e ia requerer muito cuidado.
À medida que o tempo passava, seu desejo de vingança aumentava. Finalmente, sentiu que não podia viver mais sem aquele plano e teve certeza de que um dia iria ser realizado. Sua vingança estava garantida.
Agora, dezoito anos depois, a cortina se levantava para o primeiro ato. Mistral tinha se transformado numa mulher. Ao olhá-la, Emilie ficou satisfeita: era linda o suficiente para o papel que queria lhe dar naquele drama.
Então, vendo o olhar límpido da garota, sentiu um aperto no coração. Era como se Alice a estivesse olhando. Era como se estivesse vendo Alice com os lábios trêmulos.
—Por favor, tia Emilie, por favor! Explique as coisas para mim. Todos esses segredos estão me deixando com medo.
Mesmo enquanto implorava, Mistral sabia que não ia adiantar. Os olhos da tia pareceram se suavizar de repente; depois, virou o rosto e caminhou para a lareira:
—Deve confiar em mim. Além do mais, não há nada para explicar. Esta noite vamos jantar no restaurante. Deve usar o vestido de chiffon. O Gerente me avisou que haverá uma grande festa. Toda Monte Carlo estará aqui. Você conhecerá as pessoas famosas; depois, vamos ao salão de concertos do Cassino.
Mistral bateu palmas.
—Vamos ver as pessoas jogando, tia Emilie?
—Sim, vamos observar as mesas. É interessante ver as pessoas passando por bobas.
—Não é certo jogar?
—Não vejo nada de errado em uma pessoa fazer o que gosta e se divertir. Geralmente, quem diz que o jogo é errado tem caráter fraco, pois não consegue parar antes de entregar todo seu dinheiro ou perder mais do que tem. Não vejo por que o jogo seria errado.
—Eu só estava perguntando. Uma freira do colégio disse que, apesar de o jogo ter trazido grande prosperidade a Mônaco e ter beneficiado muito os pobres do principado, ela sentia que era errado porque incentivava o desejo das pessoas por dinheiro.
—Uma ideia estreita para uma mulher que vive fechada— Emilie murmurou—, não deve aceitar as ideias das freiras, Mistral.
—Até agora, não tive oportunidade de fazer outra coisa.
Não foi uma resposta impertinente; apenas a confirmação de um fato. Mas, durante um momento, Emilie olhou-a, espantada:
—Está certa. Tinha esquecido que passou muito tempo no internato e não conhece nada do mundo.
—Por que nunca deixou que eu voltasse para a fazenda?
—Porque eu também saí de lá. Queria que você crescesse como uma dama, como sua mãe. A vida na fazenda era dura. Depois que meu avô morreu, não havia dinheiro para pagar os empregados. A não ser que eu trabalhasse como escrava, dia após dia, não poderia continuar com ela. Queria pagar sua educação, Mistral, e queria uma vida agradável para mim mesma. Portanto, quando foi para o convento, vendi a fazenda e fui para Paris.
—Paris? E gostou de lá, titia?
—Trabalhei muito, mas acho que gostei e estava feliz. Eu tinha um objetivo e sentia que cada dia me aproximava mais dele.
Mistral aproximou-se.
—Tia Emilie, está gostando de ficarmos juntas, não?
Mais do que uma pergunta, era o pedido de uma criança que queria carinho, que desejava amor. Mas um pedido feito a alguém que nunca soube o que era amar. Emilie poderia ter entendido há dezoito anos. Mas, agora, estava surda ao apelo de Mistral.
—Claro— disse, friamente—, estou muito contente e sei que vamos nos divertir muito. Agora, chame Jeanne que tenho algumas ordens a dar a ela.
Não percebeu o desapontamento da garota nem a dor violenta que surgiu nos olhos dela.
Obediente, Mistral saiu da sala para chamar a empregada.
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