Ele visitaria o casebre de Gaunt primeiro, então, e levaria Nagini: não se separaria mais da cobra... E ele saiu da sala, atravessou o hall e se dirigiu ao jardim escuro onde jorrava a fonte; em ofidioglossia, chamou a cobra, que foi se juntar a ele como uma comprida sombra...
Os olhos de Harry se abriram subitamente quando voltou ao presente: ele estava deitado na margem do lago ao sol poente, e Rony e Hermione o observavam. A julgar por suas expressões preocupadas, e o latejamento contínuo de sua cicatriz, sua rápida excursão à mente de Voldemort não passara despercebida. Ele fez força para se levantar, tremendo, vagamente surpreso que ainda estivesse molhado até os ossos, e viu a taça inocentemente pousada no capim à sua frente, e o lago azul-escuro pontilhado de dourado ao sol que se punha.
— Ele sabe. — Sua própria voz pareceu estranha e grave depois dos gritos agudos de Voldemort. — Ele sabe e vai verificar as outras Horcruxes, e a última — ele já se pusera de pé — está em Hogwarts. Eu sabia. Eu sabia .
— Quê?
Rony olhava-o boquiaberto; Hermione se ergueu nos joelhos, preocupada.
— Mas que foi que você viu? Como sabe?
— Eu o vi descobrir o que aconteceu com a taça, eu... eu estava na cabeça dele, ele está — Harry lembrou-se da matança — está enfurecido ao extremo, e amedrontado também, não consegue entender como soubemos, e agora vai checar se as outras estão seguras, o anel primeiro. Ele acha que a Horcrux em Hogwarts está a salvo, porque Snape está lá, e será dificílimo entrar na escola sem ser visto, acho que vai verificar essa por último, ainda assim, estaria lá em poucas horas...
— Você viu onde, em Hogwarts? — perguntou Rony, agora se levantando também.
— Não, ele estava se concentrando em avisar Snape... não pensou no lugar exato em que está...
— Espere, espere ! — gritou Hermione, quando Rony recolheu a Horcrux e Harry tornou a apanhar a Capa da Invisibilidade. — Não podemos simplesmente ir, nem temos um plano, precisamos...
— Precisamos ir andando — disse Harry, com firmeza. Tinha tido a esperança de dormir, a expectativa de entrar na barraca nova, mas isso agora era impossível. — Vocês podem imaginar o que ele vai fazer quando descobrir que o anel e o medalhão desapareceram? E se mudar o esconderijo da Horcrux de Hogwarts, resolver que não está bastante segura?
— Mas como vamos entrar?
— Bem, vamos a Hogsmeade — disse Harry —, e tentar pensar em alguma coisa depois de vermos qual é a proteção em torno da escola. Entre embaixo da capa, Hermione, quero todos juntos desta vez.
— Mas não cabemos realmente...
— Estará escuro, ninguém vai reparar nos nossos pés.
O ruído de enormes asas batendo ecoou pelas águas escuras do lago: o dragão saciara a sede e levantara vôo. Os garotos pararam os preparativos para observá-lo subir sempre mais alto, agora uma mancha negra no céu que escurecia rapidamente e, por fim, sumindo atrás de uma montanha próxima. Então, Hermione se adiantou e se encaixou entre os dois. Harry puxou a capa para baixo até onde foi possível, e juntos rodopiaram e penetraram na escuridão esmagadora.
28
O espelho desaparecido
Os pés de Harry tocaram na estrada. Ele viu a rua principal de Hogsmeade, penosamente familiar: vitrines apagadas, os contornos escuros das montanhas além, a curva da estradinha que a ligava a Hogwarts à frente, e a luz das janelas do Três Vassouras; e com um sobressalto, lembrou-se, com absoluta precisão, de como aparatara ali quase um ano antes, sustentando um Dumbledore desesperadamente fraco; tudo isso no segundo em que descia — e então, quando largou os braços de Rony e Hermione, aconteceu.
O ar foi cortado por um grito que lembrava o de Voldemort ao perceber que a taça fora roubada: despedaçou todos os nervos do corpo de Harry, e ele percebeu imediatamente que fora causado por sua aparição. Quando olhou para os amigos sob a capa, a porta do Três Vassouras se escancarou e uma dúzia de Comensais da Morte, de capa e capuz, correu para a rua, empunhando varinhas.
Harry segurou o pulso de Rony ao vê-lo erguer a varinha. Havia bruxos demais para estuporar: até porque uma tentativa denunciaria sua posição. Um dos Comensais da Morte acenou com a varinha e o grito parou, ainda ecoando nas montanhas distantes.
— Accio capa ! — rugiu o Comensal.
Harry segurou-a pelas dobras, mas a capa não tentou lhe escapar: o Feitiço Convocatório não a afetara.
— Então, não está embaixo do seu xale, Potter? — berrou o Comensal da Morte que tentara o feitiço, e voltando-se para os companheiros: — Espalhem-se. Ele está aqui.
Seis dos Comensais saíram em sua direção: Harry, Rony e Hermione recuaram o mais rápido possível para a rua lateral mais próxima, e, por um triz, não foram pegos. Os garotos aguardaram no escuro, escutando gente correndo para cima e para baixo, os feixes de luz das varinhas dos bruxos varrendo a rua à sua procura.
— Vamos embora! — cochichou Hermione. — Desaparatar agora!
— Grande idéia — disse Rony, mas, antes que Harry pudesse responder, um Comensal gritou:
— Sabemos que você está aqui, Potter, e não tem como escapar! Nós o encontraremos!
— Estavam de prontidão — sussurrou Harry. — Armaram aquele feitiço para avisá-los da nossa chegada. Imagino que tenham feito alguma coisa para nos segurar aqui, nos encurralar...
— Que tal uns dementadores? — gritou outro Comensal da Morte. — Se os deixássemos à vontade, eles não demorariam a encontrá-lo.
— O Lorde das Trevas não quer que ninguém mate Potter exceto ele...
— ... e os dementadores não irão matar Potter! O Lorde das Trevas quer a vida dele, e não a alma. Será mais fácil matá-lo se tiver sido beijado antes!
Ouviram-se rumores de aprovação. O temor apoderou-se de Harry: para repelir dementadores teriam que produzir Patronos, e isso os denunciaria na mesma hora.
— É melhor desaparatar, Harry! — sussurrou Hermione. Enquanto ela pronunciava essas palavras, ele sentiu um frio anormal baixando sobre a rua. A luz ambiente foi sugada até as estrelas, fazendo-as desaparecer. Na escuridão de breu, Harry sentiu Hermione agarrar o seu braço e, juntos, eles rodopiaram.
O ar que precisavam para se mover parecia ter se solidificado: não poderiam desaparatar; os Comensais da Morte tinham lançado os seus feitiços, eficientemente. O frio começou a cortar cada vez mais fundo na pele de Harry. Ele, Rony e Hermione recuaram para a rua lateral, tateando o caminho ao longo da parede, procurando não fazer o menor ruído. Do outro lado da esquina, deslizando silenciosamente, vinham dementadores, dez ou mais deles, com suas capas pretas e suas mãos feridas e podres visíveis porque seu negrume era mais denso do que o da rua. Poderiam sentir o medo por perto? Harry tinha certeza que sim: eles pareciam estar avançando mais depressa agora, inspirando daquele jeito arrastado e vibrante que ele detestava, saboreando o desespero no ar, fechando o cerco...
Ergueu a varinha: não iria, não queria, ganhar o beijo do dementador, fossem quais fossem as conseqüências. Foi em Rony e Hermione que ele pensou ao sussurrar:
— Expecto patronum!
O veado prateado irrompeu de sua varinha e atacou: os dementadores se dispersaram e ouviu-se um grito de triunfo em algum lugar fora de vista.
— É ele, lá embaixo, lá embaixo, vi o Patrono dele, era um veado!
Os dementadores tinham retrocedido, as estrelas estavam reaparecendo e os passos dos Comensais da Morte se tornaram mais pesados; mas, antes que Harry em seu pânico pudesse decidir o que fazer, ouviu bem perto um rangido de ferragens, uma porta se abriu do lado esquerdo da rua estreita e uma voz áspera disse:
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