Deslizando sobre o metal quente, Harry se levantou com dificuldade e entendeu que só havia uma saída.
— Estupefaça ! — berrou, e Rony e Hermione se juntaram a ele: jatos de luz vermelha voaram contra a multidão de duendes, alguns tombaram, mas outros continuaram a avançar e Harry viu vários guardas bruxos aparecerem correndo pelo canto da passagem.
O dragão preso soltou um rugido, e um jorro de chamas voou sobre as cabeças dos duendes: os bruxos fugiram, curvados, voltando pelo caminho que tinham vindo, e uma inspiração, ou loucura, acometeu Harry. Apontando a varinha para as grossas algemas que prendiam a fera no chão, berrou:
— Relaxo!
As algemas se abriram estrepitosamente.
— Por aqui! — berrou Harry e, ainda lançando Feitiços Estuporantes, disparou em direção ao dragão cego.
— Harry... Harry... que é que você está fazendo? — bradou Hermione.
— Subam, subam, andem logo...
O dragão não percebera que estava livre: o pé de Harry encontrou a dobra de sua perna traseira e o garoto usou-a para subir em seu dorso. As escamas do animal eram duras como aço: ele nem pareceu sentir. Harry estendeu a mão; Hermione se guindou para o alto; Rony montou atrás dos dois e, no segundo seguinte, o dragão sentiu que estava livre.
Com um rugido, empinou-se nas patas traseiras: Harry firmou os joelhos contra seu corpo, agarrou-se com força às escamas espiculadas e as asas do dragão se abriram, derrubando, como pinos de boliche, os duendes aos berros, e o animal levantou vôo. Harry, Rony e Hermione, deitados em seu dorso, rasparam no teto quando o animal rumou para a abertura na passagem, perseguido pelos duendes, atirando adagas que resvalavam em seus flancos.
— Nunca sairemos daqui, é grande demais! — gritou Hermione, mas o dragão abriu a boca e arrotou chamas explodindo o túnel cujos pisos e teto racharam e desmoronaram. Usando a força, o dragão abria caminho com as garras e o corpo. Harry mantinha os olhos bem fechados para protegê-los do calor e da poeira. Ensurdecido pela colisão das pedras e os rugidos do dragão, só lhe restava agarrar-se ao seu dorso, na expectativa de ser atirado longe a qualquer momento; então, ele ouviu Hermione berrar: — Defodio !
Ela estava ajudando o dragão a alargar a passagem, cavando o teto, enquanto o animal forcejava para subir em direção ao ar fresco e se distanciar dos duendes com seus guinchos e batidas de metal; Harry e Rony a imitaram, rompendo o teto a poder de feitiços. Eles passaram pelo lago subterrâneo e a enorme fera que rastejava e rosnava pareceu sentir a liberdade e o espaço à sua frente, enquanto, às costas, a passagem era entupida pelo movimento da cauda cristada, grandes pedaços de rocha, gigantescas estalactites partidas; o ruído metálico produzido pelos duendes foi ficando mais abafado e, à frente, as chamas expelidas pelo dragão desimpediam o seu avanço...
Então, com a força dos seus feitiços somada à força bruta do dragão, eles finalmente abriram uma saída da passagem para o saguão de mármore. Duendes e bruxos gritaram e correram a se proteger, e o dragão encontrou espaço para abrir as asas: virou a cabeça chifruda para o fresco ar exterior que sentia além e partiu; com Harry, Rony e Hermione ainda agarrados ao seu dorso, ele abriu caminho pelas portas de metal, deixando-as dobradas e penduradas nas dobradiças, e se encaminhou vacilante para o Beco Diagonal, de onde se lançou em direção ao céu.
27
O esconderijo definitivo
Não havia como conduzir o dragão; o animal não via aonde estava indo, e Harry sabia que, se ele desse uma guinada ou virasse de barriga para cima em pleno vôo, eles não poderiam se agarrar às suas costas largas. Apesar disso, à medida que ganhavam altitude, e Londres se desdobrava abaixo como um mapa verde e cinzento, Harry sentia um avassalador sentimento de gratidão por uma fuga que parecera inviável. Deitado sobre o pescoço da fera, ele se aferrava com toda força às escamas metálicas, e o vento fresco acalmava a ardência e as bolhas em sua pele, as asas do dragão abanavam o ar como as pás de um moinho. As suas costas, fosse por prazer ou medo, Harry não saberia dizer, Rony não parava de xingar, aos brados, e Hermione parecia chorar.
Passados uns cinco minutos, Harry perdeu um pouco do medo imediato de que o dragão fosse se desvencilhar deles, porque, aparentemente, sua única intenção era se distanciar o máximo de sua prisão subterrânea. Porém, a questão de como ou quando iriam desmontar continuava a apavorá-lo. Ele não fazia idéia de qual era a autonomia dos dragões para voar sem precisar pousar, nem de que modo este espécime, que mal enxergava, localizaria um bom lugar para o pouso. Harry olhava constantemente para os lados, imaginando que sentiria a cicatriz formigar...
Quanto tempo levaria para Voldemort saber que tinham arrombado o cofre da família Lestrange? Quando os duendes de Gringotes avisariam Belatriz? Com que rapidez perceberiam o que fora roubado? E quando dessem por falta da taça de ouro? Voldemort saberia, finalmente, que eles estavam caçando Horcruxes...
O dragão parecia ansiar por ar mais frio e fresco: gradualmente ganhou altitude até voarem entre fiapos gelados de nuvens e Harry já não poder distinguir os pontinhos coloridos que eram os carros, entrando e saindo da capital. Continuaram a sobrevoar os campos divididos em retalhos de verde e marrom, estradas e rios que serpeavam pela paisagem como pedaços de fita fosca e acetinada.
— Que acham que ele está procurando? — berrou Rony, ao ver que rumavam sempre para o norte.
— Não faço idéia — gritou Harry, em resposta. Suas mãos estavam dormentes e frias, mas ele não se atrevia a tentar mudar de posição. Havia algum tempo que estava imaginando o que fariam se vissem o litoral passando abaixo, se o dragão fosse para alto-mar: sentia frio, dormência, isso para não mencionar a fome e a sede desesperadas. Quando, pensou ele, a fera teria comido pela última vez? Com certeza, não iria demorar muito a precisar de alimento. E se, nessa altura, percebesse que tinha três humanos muito apetitosos montados em suas costas?
O sol começou a baixar e o céu foi se tornando azul-anil, e o dragão continuava a voar, cidades grandes e pequenas abaixo desaparecendo de vista, sua enorme sombra deslizando sobre a terra como uma grande nuvem escura. Todo o corpo de Harry doía com o esforço de se segurar no dorso do animal.
— É minha imaginação — gritou Rony, depois de muito tempo de silêncio — ou estamos perdendo altitude?
Harry olhou para baixo e viu montanhas e lagos verde-escuros acobreando-se ao pôr-do-sol. A paisagem parecia se tornar mais graúda e mais detalhada enquanto espiava pelo flanco do dragão, e ele se perguntou se o animal teria pressentido a presença de água fresca pelos reflexos repentinos de sol.
Descendo gradualmente, o dragão descrevia grandes círculos espiralados, visando, aparentemente, um dos lagos de menor tamanho.
— Vamos saltar quando ele baixar o suficiente! — gritou Harry para os dois atrás. — Direto para dentro da água, antes que ele perceba que estamos aqui!
Eles concordaram, Hermione com a voz fraca: e agora Harry pôde ver a barriga larga e amarela do dragão, ondulando a superfície da água.
— AGORA!
Harry escorregou por um lado do dragão e se atirou, de pé, na superfície do lago; a queda foi maior do que estimara, e ele bateu com violência na água, submergindo como um pedregulho em um mundo gelado e verde, repleto de colmos. Bateu os pés em direção à superfície e emergiu sem fôlego. Viu, então, as marolas que se propagavam em círculos, onde Rony e Hermione tinham caído. O dragão não pareceu ter notado nada: já estava a uns quinze metros de distância, dando rápidos mergulhos sobre o lago para apanhar água com o focinho cheio de cortes. Quando Rony e Hermione subiram das profundezas do lago, cuspindo e tossindo, o animal já ia longe, as asas batendo com força para, por fim, pousar em uma margem distante.
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