— Então vá, Potter, vá!
— Certo... é...
Ele sentiu os olhares acompanhando-o quando saiu correndo do Salão Principal para o saguão ainda apinhado de alunos que se retiravam. Deixou-se arrastar por eles escadaria acima, mas, no alto, tomou um corredor deserto. O medo e o pânico anuviavam seus processos mentais. Tentou se acalmar, se concentrar na procura da Horcrux, mas seus pensamentos zumbiam, frenética e inutilmente, como vespas presas em um copo. Sem Rony e Hermione para ajudá-lo, não parecia ser capaz de colocar as idéias em ordem. Harry diminuiu o passo e parou no meio de um corredor vazio, sentou-se no pedestal que uma estátua desocupara e tirou o mapa do maroto da bolsa pendurada ao pescoço. Não viu os nomes de Rony e Hermione em lugar algum, embora a densidade dos pontos a caminho da Sala Precisa pudesse, pensou ele, estar encobrindo os dois. Tornou a guardar o mapa, escondeu o rosto nas mãos e fechou os olhos, tentando se concentrar.
Voldemort pensou que eu iria à Torre da Corvinal.
Tinha ali um fato concreto, o lugar por onde começar. Voldemort postara Aleto Carrow na sala comunal da Corvinal, e só poderia haver uma explicação: ele temia que Harry já soubesse que sua Horcrux estava ligada àquela Casa.
Entretanto, o único objeto associado à Corvinal era o diadema perdido de sua fundadora... e como poderia a Horcrux ser o diadema? Como era possível que Voldemort, que pertencia à Sonserina, tivesse encontrado o diadema que frustrara gerações de alunos da Corvinal? Quem poderia ter lhe dito onde procurar, quando não se tinha memória de alguém vivo ter visto o diadema?
De alguém vivo...
Cobertos pelas mãos, os olhos de Harry se abriram de repente. Ele saltou do pedestal e disparou pelo caminho que viera, agora em busca de sua última esperança. O barulho das centenas de pessoas que se dirigiam à Sala Precisa foi crescendo em seu retorno à escadaria de mármore. Monitores gritavam instruções, tentando não perder de vista os alunos de suas Casas; havia muito aperto e empurrão; Harry viu Zacarias Smith atropelando estudantes do primeiro ano para chegar à frente da fila; aqui e ali, os mais novos choravam, enquanto os mais velhos chamavam, desesperados, pelos amigos e parentes...
Harry avistou o vulto branco-perolado flutuando pelo saguão de entrada e berrou o mais alto que pôde para se sobrepor ao clamor geral.
— Nick! NICK! Preciso falar com você!
Ele abriu caminho à força pela maré de alunos e, finalmente, chegou ao pé da escadaria onde Nick Quase Sem Cabeça, o fantasma da Torre da Grifinória, o aguardava.
— Harry! Meu caro rapaz! — Nick fez menção de segurar as mãos de Harry nas dele: o garoto teve a sensação de que tinham sido enfiadas em água gelada.
— Nick, você precisa me ajudar. Quem é o fantasma da Torre da Corvinal?
Nick Quase Sem Cabeça pareceu surpreso e ligeiramente ofendido.
— A Mulher Cinzenta, naturalmente, mas se precisa de serviços fantasmais...
— Tem que ser ela... você sabe onde ela está neste momento?
— Vejamos...
A cabeça de Nick oscilou um pouco sobre a gola de tufos engomados quando a virou para cá e para lá, espiando por cima do enxame de estudantes.
— Olhe ela ali, Harry, a jovem de cabelos longos.
Harry olhou na direção que o indicador transparente de Nick apontava e viu uma fantasma alta que percebeu o garoto olhando-a, ergueu as sobrancelhas e se afastou, atravessando uma parede maciça.
Harry correu atrás dela. Ao cruzar a porta do corredor em que a Mulher Cinzenta desaparecera, ele a viu quase no final, ainda se distanciando suavemente.
— Ei... espere... volte!
Ela concordou em parar, flutuando a alguns centímetros do chão. Harry achou-a linda, com seus cabelos até a cintura e a capa que chegava ao chão, mas parecia também arrogante e orgulhosa. De perto, ele a reconheceu como a fantasma pela qual passara tantas vezes no corredor, mas a quem nunca se dirigira.
— A senhora é a Mulher Cinzenta? Ela assentiu silenciosamente.
— O fantasma da Torre da Corvinal?
— Correto.
Seu tom não era encorajador.
— Por favor, preciso de ajuda. Preciso saber qualquer coisa que a senhora possa me dizer sobre o diadema perdido.
Um sorriso frio arqueou os seus lábios.
— Receio — disse, virando-se para ir embora — não poder ajudá-lo.
— ESPERE!
Harry não pretendia gritar, mas a raiva e o pânico ameaçavam dominá-lo. Olhou para o seu relógio de pulso enquanto ela pairava ali: faltavam quinze minutos para a meia-noite.
— É urgente — disse ele, com veemência. — Se aquele diadema está em Hogwarts, preciso encontrá-lo, e depressa.
— Você não é o primeiro estudante a cobiçar o diadema — respondeu ela, desdenhosamente. — Gerações de estudantes têm me importunado...
— Não se trata de obter notas melhores! — gritou Harry. — Trata-se de Voldemort... de derrotar Voldemort... ou a senhora não está interessada nisso?
Ela não podia corar, mas suas faces transparentes se tornaram opacas e sua voz irritada ao responder:
— É claro que eu... como se atreve a insinuar...?
— Bem, me ajude, então!
Sua serenidade foi se desfazendo.
— Não... não é uma questão de... — gaguejou ela. — O diadema de minha mãe...
— De sua mãe ?
Ela pareceu aborrecida consigo mesma.
— Quando eu era viva — disse, formalmente —, fui Helena Ravenclaw.
— A senhora é filha dela? Mas, então, deve saber o que aconteceu ao diadema!
— Embora o diadema conceda sabedoria — disse, com um esforço óbvio para se controlar —, duvido que possa aumentar expressivamente as suas chances de derrotar o bruxo que se intitula Lord...
— Acabei de lhe dizer: não estou interessado em usá-lo! — enfatizou Harry, impetuosamente. — Não há tempo para explicar, mas se a senhora tem apreço por Hogwarts, se quer ver Voldemort liquidado, tem que me dizer o que souber sobre o diadema!
A Mulher Cinzenta ficou muito quieta, flutuando no ar, olhando Harry do alto, e uma sensação de desamparo o invadiu. Naturalmente que se ela soubesse de alguma coisa, teria contado a Flitwick ou a Dumbledore, que, sem dúvida, já lhe teriam feito a mesma pergunta. Ele balançara a cabeça e fizera menção de ir embora, quando a fantasma falou em voz baixa:
— Eu roubei o diadema da minha mãe.
— A senhora... a senhora fez o quê?
— Roubei o diadema — repetiu Helena Ravenclaw, sussurrando. -Desejava me tornar mais inteligente, mais importante do que a minha mãe, e fugi com o diadema.
Harry não sabia como conseguira ganhar sua confiança, nem perguntou: simplesmente escutou, atento, quando ela continuou:
— Minha mãe, dizem, nunca admitiu que o diadema tinha desaparecido, fingiu que continuava em seu poder. Escondeu sua perda, minha terrível traição, até dos fundadores de Hogwarts.
“Então ela caiu doente, fatalmente doente. Apesar da minha perfídia, quis desesperadamente me ver pela última vez. Mandou à minha procura um homem que sempre me amara, embora eu desdenhasse suas propostas amorosas. Minha mãe sabia que ele não descansaria até fazer o que lhe pedira.”
Harry aguardou. A Mulher Cinzenta inspirou profundamente e atirou a cabeça para trás.
— Ele seguiu o meu rastro até a floresta em que eu estava escondida. Quando me recusei a acompanhá-lo, tornou-se violento. O barão sempre foi um homem de temperamento colérico. Furioso com a minha recusa, invejando a minha liberdade, ele me apunhalou.
— O barão ? A senhora está se referindo...?
— Sim, ao Barão Sangrento — respondeu a Mulher Cinzenta, e, afastando a capa que usava, mostrou um único ferimento em seu peito branco. — Quando ele viu o que tinha feito, foi invadido pelo remorso. Apanhou a arma com que tirara minha vida e usou-a para se matar. E séculos depois ele ainda usa correntes como um ato de penitência... como deveria — acrescentou, amargurada.
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