Num piscar de olhos Kyou a segurou pelos braços e puxou-a para cima, inclinando a cabeça para baixo, a centímetros do rosto dela. Ele rosnou com raiva: “Preste atenção”.
Kyoko piscou, sem acreditar no que via. Em pé defronte dela não estava aquele com quem ela falava um momento antes. Ela estava olhando para um par de olhos dourados, irritantemente brilhantes, irritados, e sob eles havia presas pequenas e brancas. Ela podia sentir garras retendo seus braços naquele momento.
Seu cabelo estava duas vezes mais comprido do que há um instante e parecia quase flutuar ao redor dele como se esperasse ser notado. Com um grito assustado, Kyoko se soltou e deu um passo para trás rapidamente. Foi o que bastou para ele avançar um passo ameaçador
“Você é um guardião?”, ela gaguejou.
“E você é a sacerdotisa que já deveria saber disso”, ele sibilou perseguindo-embora sentisse sua raiva diminuir.
Ela voltou-se para correr até a porta, mas gritou na mesma hora em que sentiu braços fortes agarrando-a por trás.
Kyou apertou-a de encontro o corpo enquanto ela lutava. Ele ergueu-a do chão e seus pés chutavam o ar enquanto ela tentava escapar. Dando-lhe tempo suficiente para perceber que era inútil tentar se libertar, ele chegou os lábios perto do ouvido dela e sussurrou: "Você vai ficar até ficar forte o suficiente para se libertar desses braços sacerdotisa”.
Ele então a ergueu no ar, jogando-a de novo no sofá recheado, onde ela aterrissou balançando. Agora, cara a cara com ele, Kyoko deu um grito furioso, logo após, fechou e abriu os olhos surpresa ao ver que ele tinha de novo a aparência do homem com quem estivera conversando.
Ela olhou para ele com raiva, esmurrou o ar, e perguntou: “Afinal, o que está acontecendo?"
Kyou estava calmo defronte dela, com a única diferença que agora seus olhos ainda estavam brilhando: ”Você vai ficar aqui”. Inclinando-se sobre ela, disse: ”Você vai me deixar treiná-la”. Ele colocou as mãos na parte de trás do sofá, prendendo-a de forma eficiente: "E desta vez, você vai ganhar sem sofrer." Seu nariz estava quase tocando o dela quando ele assobiou o final de sua declaração, que mostrava bem seu descontentamento.
Kyoko se recostou o mais distante possível no sofá, devolveu o olhar caloroso, mas ainda não se sentia ameaçada por ele. Ainda que não fosse humano, ele não tinha intenção de prejudicá-la. Ela franziu o sobrolho, percebendo o que ele tinha acabado de dizer.
“Dessa vez?” Continuou com voz macia: “O que você quer dizer com dessa vez?”
Kyou inspirou profundamente: “Você talvez tenha esquecido, mas eu não”. Seu perfume o rodeava e ele sentiu a familiar pontada de dor no peito magoado, mas ela tinha que saber a verdade: "Nós lutamos juntos no passado, sacerdotisa, e está cada vez mais perto o dia em que faremos isso de novo. "
O olhar de Kyoko ficou mais suave por um instante: “Quem é você?”.
“Sou seu guardião”. Kyoko, sei que você esqueceu porque sacrificou suas lembranças de nós para trazer de volta a este mundo o Cristal do Coração Guardião. Seu olhar buscou o dela e sua voz tornou-se um mero sussurro: ”Você precisa confiar em mim”.
Ainda que ele tivesse acabado de tentar assustá-la, tudo dentro dela lhe dizia para confiar nele. “Eu confio em você”. Tão logo murmurou essas palavras, sentiu-se envolvida pelos braços dele. Logo de início ficou tensa, mas logo sentiu um manto de calor envolvendo-a e entregou-se ao seu abraço relaxante em serena confusão.
Não pôde evitá-lo. Ele vinha carregando o peso da rejeição por tanto tempo que uma carga do tamanho do mundo foi aliviada de seus ombros tensos. Ele a apertou contra si, envolveu-se com seu aroma enquanto acariciava o rosto nos seus cabelos.
“Desta vez, fique!”, sussurrou num momento e fraqueza.
Kyoko podia sentir a ternura nas palavras dele e em seus braços, porém, ainda assim, tinha acabado de assustá-la e agora a segurava como se sua própria vida dependesse disso. Ela estava dividida entre ter medo dele ou ceder ao desejo de acariciar face
Cheia de dúvidas, murmurou no peito dele: “Queria lembrar o que você disse, eu esqueci. O que eu preciso saber?”.
Kyou fechou os olhos dourados não querendo ainda voltar ao mundo real naquele momento, pois ela estava exatamente onde devia...em seus braços. Com um suspiro e contra a vontade, levou-a de novo ao sofá e sentou-se ao lado dela.
Passando a mão através da longa franja de seus cabelos, Kyou respirou fundo procurando se acalmar. Sossegando seus ímpetos, ele se concentrou na parede em frente e começou lhe dizer o que queria que ela soubesse. Ouvir alguma coisa não é igual a se lembrar dessa coisa.
“Você terá ajuda. Reuni todas as pessoas que chegaram até aqui com bolsas de estudo, da mesma maneira que você. Não se lembram de você e você não se lembra delas, mas elas lutaram por você naquela época, e lutarão de novo quando o momento chegar”; disse isso com uma voz sugestiva de suas lembranças do passado.
Os olhos de Kyoko se arregalaram. ”Suki e Shinbe fazem parte?”. Ela se perguntava por que acreditava nele tão prontamente.
Kyou fez que sim. ”Percebi que você já os conheceu. Sim, você era íntima deles, assim como Toya que foi incomparável na sua proteção”.
“Toya?” Ela arqueou uma sobrancelha para ele. “Você deve estar brincando”. Ela acrescentou mentalmente: ”Ele nem ao menos gosta de mim”.
Kyou deu um suspiro relutante: ”Toya não mudou nesta vida, ainda é o mesmo obstinado e teimoso jovem do passado. Mas sim, ele a protegeu com muita determinação, e teria morrido por você, se tivesse sido necessário”.
Kyoko franziu o sobrolho:” Ele não se lembra?” Ela sentiu que ele estava dizendo a verdade, fazia sentido ela ter perdido parcialmente a memória. Seus olhos procuraram os dele querendo ter essa lembrança de volta.
Kyou negou levemente com a cabeça: “Eu fui o único que não voltou com você. Portanto, sou o único que se lembra do que ocorreu. Toya nem se lembra que é meu irmão”.
Kyoko respirou profundo com essa confissão: “Irmãos? O que aconteceu para somente você se lembrar? Ela tinha que saber.
“Você renunciou a todas as suas recordações durante a batalha para vencer o mal no nosso mundo e salvar o cristal do coração guardião. E naquele preciso instante, pediu ao cristal para ver todos de novo. Você não queria perdê-los. Quando você desapareceu de repente, todos também o fizeram, incluindo o inimigo. Inconscientemente você trouxe todos consigo”.
Ele suspirou com pesar. “Eu havia lançado um feitiço para me proteger de tais pedidos. ”Seus olhos ficaram distantes, como se ele estivesse revivendo a lembrança.
“Você trouxe todos consigo sem se dar conta disso. Todos renasceram aqui, no seu tempo, deixando-me sozinho no passado”. Seus olhos encontraram os dela. “Assim, eu sobrevivi e esperei por você. Quando o tempo certo chegou, reuni todos que tinham me deixado. Agora você trouxe o cristal, junto com a malevolência que o deseja. ─ sua voz se tornou mais pesada. “O mal já procura por você e eu vou impedir isso”.
Kyoko concordou tentando entender: “Então, todos os que chegaram aqui da mesma maneira que eu, são confiáveis?” Ele fez que sim com a cabeça e Kyoko continuou: “Eles sabem sobre isso?”
Kyou negou com a cabeça: “Eles sentirão um vínculo e este vínculo aumentará, mas, afora isso, eu não conheço o futuro, somente o passado Eles a protegerão como o fizeram antes. Eles nasceram para fazer isso e é para tanto que existem”.
Ele rapidamente desviou o olhar dos olhos inquisidores dela, consciente de que a verdade do que acabara de dizer também o alcançava. “Nós ainda temos algum tempo, mas agora quero que você deixe de esconder seus poderes de sacerdotisa e peço que você fique consciente do ambiente em que estiver. Vou zelar por você e já disse a Toya para prestar muita atenção também”.
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