— Não há vestígios de presença humana nesta caverna. É como se ninguém tivesse aqui estado há centenas de anos — acrescentou o professor.
Nós dois o encaramos como se ele tivesse lido os nossos pensamentos. O grego começou a tirar a roupa e preparou-se para entrar na água.
— Tens a certeza que consegues nadar até lá?
Ele sorriu com um aceno de cabeça.
Ele entrou na água e começou a remar enquanto tremia e a névoa saía-lhe pela boca. Ele estava a nadar há pouco tempo quando ouvimos um respingo na água e uma pequena onda se formou a poucos metros de onde ele estava.
— Olha para aquilo, — disse o professor.
— Nada até à costa o mais rápido que puderes! — Gritei para ele instantaneamente. — Há algo na água!
Kalisteas olhou para a esquerda e viu-o aproximar-se a alta velocidade.
— Ilumine para ali, professor! — Eu disse enquanto tirava o meu revólver da mochila e começava a atirar naquela direção.
O som dos tiros pareceu assustar a criatura do lago e Kalisteas conseguiu alcançar a costa são e salvo.
— Agora já sabemos porque é que ninguém atravessa esta lagoa há anos, — disse o grego, tentando secar-se e voltar a vestir-se.
— E agora? — Observou o professor.
— Não faço a mínima ideia — respondi, olhando para aquela caverna sinistra mais uma vez.
Passámos algum tempo a examinar cada canto tentando encontrar uma solução. A princípio, pensámos que a melhor ideia era regressar e voltar noutro dia com o equipamento certo, mas estávamos longe da cidade mais próxima e a entrada da caverna ficaria submersa novamente em alguns dias, por isso teríamos que esperar um ano inteiro para tentar novamente.
Exaustos, sentámo-nos num conjunto de pedras na beira da água. Apesar da escuridão, as tochas que tínhamos colocado na costa refletiam-se nas águas da lagoa, desenhando um céu estrelado sobre a abóbada da caverna.
Foi essa visão que me fez lembrar de quando, há anos atrás, me levantei antes do amanhecer para empreender a árdua subida dos picos alpinos durante as minhas férias na Suíça.
— Quanta corda trouxeste? — Perguntei a Kalisteas, levantando-me do assento como uma mola.
— A quantidade que pediste. Tem vários metros.
— Vês a parede que atravessa a gruta da esquerda para a direita? — Eu falei, apontando para ela — Começa nesta ponta e vai dar ao pequeno altar. Se eu conseguir passar, não preciso molhar um dedo.
— Enlouqueceste? — O professor repreendeu-me como se estivesse a ensinar na sua sala de aula em Oxford.
— Eu consigo atravessar aquela parede de uma ponta à outra. — Vejam — apontei — a humidade formou inúmeras cavidades na rocha. Pode ser escalada sem grandes problemas. Só espero ter metros de corda suficientes.
— É muito arriscado — acrescentou Kalisteas. Foi a primeira vez que notei o medo nos seus olhos.
— Não vim até aqui para dar meia-volta quando estamos prestes a fazer a maior descoberta da história — respondi com raiva.
Ambos olharam para baixo e não abriram a boca.
Preparamos todo o equipamento necessário e, após pensar pela última vez, iniciei a subida. O primeiro trecho era fácil, a altura não era excessiva, podia ficar uns seis metros acima do nível da lagoa, alto o suficiente para que nada me pudesse atacar da água.
Eu cravava pregos na rocha enquanto amarrava a corda neles e passava ao redor da cintura para evitar qualquer queda. Avancei assim ao longo da parede em direção à outra margem, dando um passo atrás do outro com muito cuidado, aproveitando os buracos naturais que a humidade formou ao longo dos anos.
Quando cheguei à mediação, começava a sentir-me exausto. Olhei para baixo uma vez e pensei ter visto a água a agitar-se suavemente no centro da lagoa.
Depois de quase meia hora eu estava exausto, embora a proximidade do altar me desse forças para continuar. O maior incómodo veio um momento depois, porque a corda estourou quando faltavam apenas alguns metros para chegar à outra margem e já conseguia distinguir aquela relíquia com total clareza.
— O que foi, amigo? — Kalisteas gritou enquanto me via levantar.
— A corda acabou! — Respondi, voltando-me para a sua posição.
— Devias ter pagado ao barqueiro, — ele rosnou com raiva. — Voltas a tentar para o ano.
Fingi não ouvir e soltei o resto da corda que ainda me restava até à beira da água. Deslizei suavemente sobre ela até que introduzi silenciosamente o meu corpo e o líquido frio atingiu o meu pescoço. Não havia como voltar atrás, comecei a nadar em direção à costa com todas as minhas forças.
A distância era curta, mas cheguei exausto pelo esforço de escalar. Quando pisei na margem, virei-me quando ouvi um rangido atrás de mim e, sem pensar duas vezes, tirei o revólver e esvaziei o carregador sem ver do que se tratava. Só pude observar algumas ondulações na água que se afastaram novamente na direção oposta.
Recuperei a calma e finalmente consegui chegar ao pequeno altar que estava localizado sobre uma rocha composta por uma lápide no meio de um cubículo e em cuja pedra havia sido entalhada uma procissão de carpideiras.
Debaixo delas havia um túmulo onde havia algumas letras que mal podiam ser lidas, desgastadas pela humidade e o passar do tempo. Passei a minha mão sobre elas e tive uma sensação que hoje ainda não consigo descrever em palavras.
Fiquei paralisado a olhar para elas por alguns momentos, até que um som alto começou a zumbir nos meus ouvidos, sem saber de onde vinha. Olhei para a lagoa e não vi nada fora do comum.
— Tens que voltar rápido! — Kalisteas começou a gritar com toda a força.
— Agora não, amigo! Finalmente encontrei! — Eu respondi.
— Esquece isso se não queres que seja a última coisa que fazes na vida! Está a formar-se uma tempestade sobre a lagoa e em alguns minutos a caverna será completamente inundada com água!
Estas palavras apunhalaram-me no coração.
— Tudo bem! — Respondi com resignação. — Só há uma opção para voltar com vocês!
— Estou a ouvir!
— Atira pedra para a água para atrair a atenção do nosso amigo! Assim que o vires aproximar-se, faz-me sinal com a tocha!
— Entendido!
Kalisteas balançou a tocha de um lado para o outro, momentos depois. Naquele momento entrei na água e comecei a nadar até à corda, agarrei-a com as duas mãos e comecei a pulsar o mais rápido que pude. Quando cheguei ao primeiro prego, enrolei a corda em volta da cintura novamente e fiz todo o caminho até a outra margem como um cavalo a cavalgar ao vento.
A tempestade não parava de trovejar lá fora com mais força, quando cheguei à outra margem as minhas mãos estavam ensanguentadas pelo grande esforço que havia feito.
O grego conduziu-nos à pressa pelos túneis até chegarmos à cavidade de entrada, onde a água havia subido quase até à altura do teto. Nadámos rapidamente para o lago enquanto as nossas cabeças mal saíam da água.
Já podíamos ver a saída quando a caverna ficou completamente alagada, respirámos fundo e tivemos que mergulhar no trecho final até que finalmente imergimos no lago à mesma altura onde o barqueiro nos esperava.
A viagem de volta teve um gosto agridoce. Havíamos feito a maior descoberta da história, mas não tínhamos nenhuma evidência que o confirmasse. E o pior de tudo, teríamos que esperar um ano inteiro para tentar novamente.
Capítulo I
Londres, 1922
Estava a caminho do Museu Britânico num táxi que apanhara na esquina da White Hurtline e já estava atrasado para a exposição que acontecia naquela noite na sua sala principal. Todos os editores dos jornais mais importantes da cidade foram fazer a cobertura das notícias do ano. Pela primeira vez, a descoberta arqueológica mais aclamada dos últimos anos podia ser vista em Londres. Nenhum jornalista que se preze poderia perder o evento.
Читать дальше