- A cidade já está aterrorizada com Randall à solta – o prefeito continuou, realmente irritado. – Você sabe tão bem quanto eu que estamos recebendo pelo menos trinta ligações por dia de pessoas preocupadas achando que viram ele. Quando souberem desse assassinato—e vamos ser realistas, é só uma questão de tempo—todo mundo vai saber que foi ele. E se a porra da Avery Black estiver no caso, ou perto do caso—
- Isso não vai importar – Avery disse, tendo escutado o suficiente.
- O que você disse? – O prefeito Greenwald quase gritou.
- Eu disse que não vai importar. Howard Randall não cometeu esse crime.
- Avery... – O’Malley disse.
Nesse momento, Connelly e o Prefeito Greenwald a olharam como se tivesse surgido nela um terceiro braço.
- Você está falando sério? – Greenwald perguntou.
E antes que ela pudesse responder, Connelly falou—o que não a surpreendeu.
- Black... Você sabe que isso é coisa de Howard Randall. Por que diabos você pensaria que não é?
- Apenas veja os arquivos, senhor – ela disse. Depois, olhou para Greenwald e acrescentou: - O mesmo serve para você. Veja os arquivos de Howard Randall. Encontre um dos assassinatos dele onde ele fez algo desse tipo—algo tão fora do normal e sangrento. Desmembramento é uma coisa. Mas isso vai muito além. Howard estrangulou a maioria de suas vítimas primeiro. O que estou vendo nesse último crime é muito pior que algo assim.
- Howard Randall esmagou a cabeça de uma mulher com um tijolo – Greenwald disse. – Eu diria que isso é bem sangrento e brutal.
- É sim. No entanto, aquela mulher foi atingida duas vezes e a investigação diz que foi o segundo golpe que a matou—não o primeiro. Howard Randall não está nessa pela emoção, violência ou pela exploração. Mesmo quando despedaçou os corpos, tinha pouco sangue. Era quase como se ele evitasse sangue, apesar de seus atos. Mas esse assassinato aqui... é demais. É sem fundamento. E mesmo que seja um monstro e com certeza um assassino, Howard Randall não é alguém sem fundamento.
Avery viu uma mudança na expressão de Connelly. Ele estava ao menos pensando naquilo, considerando seus exemplos. O prefeito Greenwald, por outro lado, não estava aceitando a ideia.
- Não. Isso é obra de Howard Randall e é ridículo pensar outra coisa. Até onde eu sei, esse assassinato colocou fogo em todo o A1—caramba, em todos os departamentos da cidade! Eu quero Howard Randall algemados ou cabeças vão rolar! E imediatamente, eu quero a Black fora desse caso. Ela não pode estar envolvida de nenhuma maneira!
Depois disso, Greenwald voltou a seu carro esbravejando. Avery já havia sofrido com reuniões com ele no passado e estava começando a pensar que ele era sempre assim. Ela nunca havia o visto caminhando normalmente.
- Você voltou ao trabalho há meia hora – O’Malley disse, - e já conseguiu tirar o prefeito do sério.
- Não estou trabalhando – ela pontuou. – Como ele descobriu que eu estava aqui, afinal?
- Não faço ideia – Connelly disse. – Nós achamos que alguém da mídia viu você deixando o departamento e alguém disse algo para ele. Tentamos chegar aqui antes que ele, mas não conseguimos. – Ele suspirou, puxou o ar e acrescentou: - Quão certa você está de que não foi Howard Randall? Definitivamente?
- Claro que não é definitivamente. Mas isso aqui não casa com nenhum dos assassinatos dele. Esse aqui é diferente. Parece diferente.
- Poderia ser uma imitação? – Connelly perguntou.
- Poderia, eu acho. Mas por que? E se for, esse cara está fazendo um trabalho ruim.
- E um fanático de merda por cultura de assassinatos? – Connelly perguntou. – Um desses derrotados que juntam material sobre serial killers e, com o escape de Randall, finalmente criou coragem para matar pela primeira vez.
- Pode ser um caminho.
- Então eu não devo relacionar a recente fuga de Howard Randall com um assassinato tão parecido com o estilo dos antigos crimes dele.
- Senhor, você pediu minha opinião e eu lhe disse.
- Bem – Connelly disse, - você ouviu o Greenwald. Não posso mais deixar você ajudar nisso. Agradeço você ter vindo hoje pela manhã quando eu chamei mas... Acho que foi um erro.
- Acho que sim – ela disse, odiando a facilidade com que Connelly cedia à pressão do prefeito. Ele sempre fazia isso e essa era uma das razões pela qual era achava difícil respeitar o capitão.
- Desculpe – O’Malley disse a ela quando eles voltaram para o carro. Finley estava atrás deles, e assistira a toda a cena com um desconforto aparente. – Mas talvez ele esteja certo. Mesmo que o prefeito tenha sido muito duro, você acha mesmo que esse é o tipo de coisa em qual você deveria se envolver agora? Faz só duas semanas desde o seu último grande caso—onde você quase morreu, tenho que dizer. E duas semanas desde que Ramirez...
- Ele está certo – Connelly disse. – Tire mais um tempo. Mais algumas semanas. Você consegue?
- Se tem que ser assim – ela disse, indo para o carro com Finley. – Boa sorte com esse assassino. Você vão encontra-lo. Tenho certeza.
- Black – Connelly disse. – Não leve para o pessoal.
Ela não respondeu. Entrou no carro com pressa, dando a Finley apenas alguns segundos para entrar no carro antes que ela arrancasse, deixando para trás a rua e um corpo morto, que ela tinha quase certeza de que não fora assassinado pelo recém-livre Howard Randall.
Avery estava muito irritada e cheia de adrenalina para voltar ao hospital. Ao invés disso, depois de deixar Finley novamente no departamento e pegar seu próprio carro, ela foi para seu apartamento. Havia várias caixas nos fundos do guarda-roupa cujas quais ela de repente sentiu a necessidade de abrir. Mais do que isso, com sua mente um pouco mais ativa e ligada no mundo real, ela percebeu que havia também alguém para quem precisava ligar.
Quando ligou para Rose, sua filha ficou orgulhosa com o convite para visita-la mais tarde para jantar e tomar uma taça de vinho. Elas ignoraram o fato de que ainda faltavam dezesseis meses para que Rose pudesse tomar um drink legalmente.
Quando chegou a seu apartamento, pouco antes das dez da manhã, Avery preparou um café e dois sanduíches. Mesmo que fosse só presunto velho, queijo e maionese em um pão branco, já era uma refeição muito melhor do que a comida servida na cafeteria do hospital, que a alimentara pelos últimos dias. Ela comeu os sanduíches quase sem sentir e seguiu para o quarto, abriu o guarda-roupa e puxou as caixas lá do fundo.
Havia duas caixas, uma cheia de vários arquivos de sua carreira como advogada de moderado de sucesso. Ela ficou tentada a olhar aquela, mesmo que tivesse representado algumas pessoas em casos de assassinato. No entanto, ao invés disso, pegou uma caixa que sabia que a daria alguma ideia sobre o que havia visto naquela manhã.
A segunda caixa estava cheia de arquivos do caso de Howard Randall. O caso havia acontecido cerca de três anos antes, mas parecia algo em que Avery havia participado em outra vida. Talvez fosse por isso que ela achava tão fácil e quase convencional procura-lo para pedir conselhos. Talvez, ela havia conseguido se afastar o suficiente do caso e do que ele causara para sua carreira na advocacia.
A pilha de arquivos contava uma história que ela conhecia por dentro e por fora, mas colocar os dedos nas páginas e fotos era peneirar a areia do tempo, analisando novamente os grãos para aprender alguma lição que pudesse ter deixado passar. Eles contavam a história de Howard Randall, que, quando garoto, apanhara a infância inteira de sua mãe abusiva. Era o mesmo garoto que fora molestado no ensino médio, em um banheiro, por um professor de educação física—um garoto que crescera para tornar-se não só um homem que mostraria toda a raiva construída por dentro, mas também usa-la para moldar e definir uma mente brilhante que ele nunca se preocupara em usar na escola. Não, ele havia guardado seu brilhantismo para a faculdade, para aumentar suas notas e depois impressionar os agentes de admissão e registros de Harvard. Ele foi às aulas, graduou-se e acabou dando aulas por lá.
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