— Caro Coronel — disse ela, aproximando-se tanto quanto possível da webcam, de modo que seus olhos verdes-esmeralda pudessem obter o efeito que esperava: — o senhor tem toda a razão.
Sabia bem que dar razão ao interlocutor, o teria preparado de forma mais positiva.
— Mas agora que estamos tão perto.
— Perto do quê? — o Coronel gritou, levantando-se da cadeira e apoiando os punhos sobre a mesa. — Há semanas que persistiu com a mesma história. Não estou disposto a confiar mais sem ver com os meus próprios olhos algo de concreto.
— Se o senhor me der a honra da sua companhia esta noite no jantar, terei o maior prazer de lhe mostrar algo que irá fazê-lo mudar de ideia. O senhor aceita?
Os dentes brancos ostentavam um sorriso bonito e o passar de mão pelo cabelo louro e comprido fazia o resto. Ela tinha certeza que o tinha convencido.
O Coronel franziu o cenho, tentando manter um olhar furioso, mas sabia que não resistiria a essa proposta. Elisa fazia o seu tipo e um jantar tête-à-tête o intrigava muito.
Além do mais ele, apesar dos seus quarenta e oito anos, era ainda um homem atraente. Corpo atlético, traços marcantes, cabelos grisalhos curtos, olhar forte e decidido de um azul intenso, uma boa cultura geral que lhe permitia manter discussões sobre muitos temas, tudo combinado com o charme indiscutível do uniforme, fazia dele um exemplar do sexo masculino ainda muito interessante.
— Ok — bufou o Coronel — mas se esta noite realmente não me mostrar algo de extraordinário, já pode começar a recolher toda a sua bugiganga e fazer as malas — ele tentou usar o tom mais autoritário possível, mas sem muito sucesso.
— Às vinte e zero horas esteja pronta. Um carro irá buscá-la no seu hotel — e desligou, um pouco arrependido de não ter se despedido.
Raios, tenho que me apressar. Tenho poucas horas antes de escurecer.
— Hisham — gritou, espiando para fora da tenda. —Reúna toda a equipe. Preciso de toda a ajuda possível.
Ela caminhou apressadamente os poucos metros que a separavam da área de escavação, deixando para trás uma série de pequenas nuvens de poeira. Em minutos, todos se reuniram ao seu redor, esperando por suas ordens.
— Você, por favor, remova a areia daquele canto — ordenou, indicando o lado da pedra mais longe dela. — e você, ajude-o. Sugiro que tomem muito cuidado. Se é o que penso, esse objeto salvará a nossa pele.
Astronave Theos Órbita de Júpiter
O pequeno, mas extremamente confortável módulo esférico de transferência interna estava correndo a uma velocidade média de cerca de 10 m/s, o condutor número três, que levaria Azakis até a entrada do compartimento onde o seu companheiro Petri o esperava.
A Theos também tinha forma esférica e um diâmetro de noventa e seis metros, equipada com dezoito condutores tubulares, cada um com pouco mais de trezentos metros, como meridianos, construídos com dez graus de distância um do outro e cobrindo toda a circunferência. Cada um dos vinte e três níveis tinha quatro metros de altura, exceto o hangar central (décimo primeiro nível) que media o dobro; eram facilmente acessíveis graças às paradas que cada condutor fazia em cada andar. Na prática, para atravessar os dois pontos mais distantes da nave, levaria no máximo quinze segundos.
A freagem foi quase imperceptível. A porta se abriu com um leve chiado e atrás dela apareceu Petri, parado com as pernas abertas e os braços cruzados.
— Há horas que espero — disse num tom decididamente pouco convincente. — Você já terminou de entupir os filtros de ar com aquela porcaria fedorenta que sempre carrega? — a alusão ao charuto era ligeiramente velada.
Indiferente à provocação, com um sorriso, Azakis pegou do cinto o analisador portátil e o ativou com um gesto do polegar.
— Segure isso e vamos logo — disse, passando o aparelho para Petri com uma das mãos, enquanto com a outra tentava colocar o sensor dentro do conector à sua direita. — Chegada prevista em aproximadamente 58 horas e estou ficando um pouco preocupado.
— Por quê? — Petri perguntou ingenuamente.
— Não sei. Tenho a sensação de que vamos ter uma grande surpresa desagradável.
A ferramenta que Petri tinha na mão começou a emitir uma série de sons em diferentes frequências. Ele olhava o aparelho sem ter ideia do que estava indicando. Olhou em direção ao amigo à procura de algum sinal, mas não viu nenhum. Azakis, movendo-se com muito cuidado, apontou o sensor no outro conector. Uma nova série de sons ininteligíveis saiu do analisador. Depois, silêncio. Azakis pegou o instrumento da mão do seu companheiro, olhou atentamente para os resultados, e em seguida sorriu.
— Tudo bem. Podemos prosseguir.
Só então Petri percebeu que prendia a respiração. Expirou todo o ar e imediatamente sentiu uma sensação de relaxamento. Uma falha de um desses conectores, por menor que fosse, poderia acabar com a missão, obrigando-os a voltar o mais rápido possível. Seria a última coisa que desejariam. Estavam tão perto.
— Vou tomar um banho — disse Petri, tentando sacudir um pouco da poeira. — a visita aos tubos de exaustão é sempre assim… — e acrescentou, franzindo o lábio superior: — instrutiva!
Azakis sorriu: — Vejo você na ponte de comando.
Petri chamou o módulo e um segundo depois, se foi.
O sistema central anunciou que a órbita de Júpiter fora superada sem problemas e que eles estavam indo sem impedimento em direção à Terra. Com um leve mas rápido movimento dos olhos para a direita, Azakis pediu ao seu O^OCM mostrar a rota novamente. O ponto azul que se movia na linha vermelha agora tinha se movido um pouco mais para perto da órbita de Marte. A contagem regressiva indicava o tempo estimado de chegada em 58 horas exatas e a velocidade da nave em 3.000 km/s. Estava cada vez mais nervoso. Por outro lado, aquela em que estava viajando era a primeira astronave equipada com os novos motores Bousen, completamente diferente de designs anteriores. Os projetistas afirmavam que seriam capazes de impulsionar a aeronave a uma velocidade perto de um décimo daquela da luz. Ele ainda não se atrevia a ir tão longe. Para o momento, 3.000 km/s pareciam mais do que suficientes para uma viagem inaugural.
Dos cinquenta e seis membros da tripulação que normalmente teriam de ser acomodados a bordo da Theos nessa primeira missão, haviam sido selecionados somente oito, incluindo Petri e Azakis. As razões dadas pelos Anciãos não foram muito exaustivas. Limitaram-se a explicações como, diante da natureza da viagem e do destino, poderiam encontrar muitas dificuldades e que, portanto, seria melhor não colocar mais vidas em risco desnecessário.
Então nós seríamos descartáveis? Que tipo de conversa era essa? Era sempre assim. Quando tinham que arriscar a pele, quem ia na frente? Azakis e Petri.
Afinal de contas, a propensão deles por aventura e também a notável capacidade de resolver situações complicadas resultaram em uma série de vantagens.
Azakis vivia em uma casa enorme, na linda cidade de Saaran, localizada ao sul do continente, que tinha sido usada até recentemente como um depósito pelos artesãos da cidade. Ele, graças às "vantagens", tinha conseguido a posse e a permissão para alterá-la à vontade.
A parede sul havia sido totalmente substituída por um campo de força semelhante ao utilizado na sua nave espacial, de modo a permiti-lhe ver, diretamente da sua inseparável poltrona auto moldável, a maravilhosa baía. Em caso de necessidade, toda a parede podia ser transformada num sistema tridimensional gigante, onde podiam ser exibidas simultaneamente até doze transmissões da Rede. Mais de uma vez, esse sofisticado sistema de controle e gestão lhe tinham permitido obter informações decisivas antecipadas, possibilitando-o assim resolver com sucesso até crises de grande importância. Ele não saberia renunciar.
Читать дальше