“Pois é,” Disse Bill. “Vão ter que o descobrir por si próprios como nós descobrimos há tantos anos atrás.”
Riley observou-o de lado enquanto se afastavam da carreira de tiro.
Tal como ela, Bill tinha quarenta anos e cabelos brancos a despontar da cabeleira escura. Perguntava-se qual o significado de o estar a comparar mentalmente com o seu magro e enjeitado vizinho.
Qual era o nome dele? Questionou-se. Ah, sim… Blaine.
Blaine era atraente, mas não estava certa se batia Bill. Bill era grande, sólido e cativante.
“O que te traz por cá?” Perguntou Riley.
“Soube que estarias cá,” Respondeu Bill.
Riley fitou-o apreensiva. Muito provavelmente, aquela não era uma visita de cortesia. Pela sua expressão, Riley percebeu que ele ainda não estava preparado para lhe contar o que queria.
Bill disse, “Posso cronometrar se quiseres fazer o exercício completo.”
“Agradecia-te,” Disse Riley.
Dirigiram-se a uma secção à parte da carreira de tiro onde não correria o risco de ser atingida por balas perdidas provenientes dos formandos.
Enquanto Bill segurava num cronómetro, Riley ultrapassou todos os níveis do curso de habilitação para manuseamento de arma, disparando contra o alvo a uma distância de três metros, depois cinco, depois sete, depois quinze. A quinta e última fase do exercício era a única parte que Riley considerava pouco desafiante – disparar atrás de uma barricada a uma distância de vinte e três metros.
Quando terminou, Riley retirou os protetores de cabeça. Ela e Bill encaminharam-se para o alvo e observaram o resultado do treino de Riley. Todas as marcas estavam juntas.
“Cem porcento – um resultado perfeito,” Disse Bill.
“Só tinha que ser,” Disse Riley. Não gostaria nada de constatar que estava a perder o jeito.
Bill apontou para o cenário natural atrás do alvo.
“Um tanto surreal, não?” Perguntou Bill.
Vários veados de cauda branca pastavam satisfeitos no alto da colina. Na verdade, tinham-se ali reunido enquanto Riley disparava. Estavam a curta distância, facilmente alcançáveis até para a sua arma. Mas a realidade é que não estavam minimamente incomodados com os milhares de balas que embatiam contra os alvos logo abaixo da cumeeira em que se encontravam.
“Sim,” Concordou Riley, “e belo.”
Naquela altura do ano os veados eram uma presença natural ali na carreira de tiro. Era época de caça e de alguma forma sabiam que ali estavam seguros. De facto, os terrenos da Academia do FBI tinham-se tornado numa espécie de refúgio de vida selvagem para muitos animais, incluindo raposas, perus selvagens e marmotas.
“Há alguns dias atrás um dos meus alunos viu um urso no parque de estacionamento,” Comentou Riley.
Riley aproximou-se da barreira. Os veados ergueram as cabeças, fitaram-na e afastaram-se. Não tinham medo de tiroteio, mas não gostavam que as pessoas se aproximassem demasiado.
“Como é que eles saberão?” Perguntou Bill. “Quero dizer, que aqui é um sítio seguro. Os tiros não soam todos da mesma forma?”
Riley limitou-se a abanar a cabeça. Era um mistério para ela. O pai tinha-a levado a caçar quando era pequena. Para ele, os veados eram simplesmente recursos – comida e pele. Não a tinha incomodado matá-los há tantos anos atrás. Mas isso tinha mudado.
Parecia estranho, agora que se dava ao trabalho de pensar nisso. Não tinha qualquer pejo em usar força letal contra um ser humano quando necessário. Podia matar um homem num abrir e fechar de olhos. Mas matar uma dessas criaturas parecia agora impensável.
Riley e Bill caminharam na direção de uma área de repouso e sentaram-se juntos numa vedação. Fosse qual fosse o motivo que o levara até ali, Bill continuava reticente em verbalizá-lo.
“Como te estás a dar sozinho?” Perguntou Riley com uma voz carinhosa.
Ela sabia que era uma questão delicada e viu-o estremecer. A mulher de Bill tinha-o deixado recentemente após anos de tensão entre o trabalho e a vida familiar. Bill tinha ficado preocupado com a perspetiva de perder o contacto com os filhos ainda tão jovens. Agora vivia num apartamento na cidade de Quantico e passava tempo com os filhos aos fins-de-semana.
“Não sei, Riley,” Disse. “Não sei se alguma vez me vou habituar.”
Era óbvio que Bill se sentia só e deprimido. Riley tinha passado por um processo semelhante depois de recentemente se ter separado e divorciado. Ela também sabia que após uma separação se ficava particularmente frágil. Mesmo que a relação não fosse das melhores, dava-se por si num mundo de estranhos, a sentir falta de anos de familiaridade, sem saber bem o que fazer.
Bill tocou-lhe no braço. Com a voz embargada pela emoção, disse, “Às vezes penso que tudo aquilo que me resta na vida… és tu.”
Naquele momento, Riley sentiu uma vontade incontrolável de o abraçar. Quando haviam sido parceiros, Bill tinha-a ajudado inúmeras vezes, tanto física como emocionalmente. Mas ela sabia que tinha que ter cuidado. E também sabia que em situações como aquela, as pessoas podiam agir de forma precipitada. Riley tinha telefonado a Bill numa noite de bebedeira e propusera-lhe iniciarem uma relação. Agora os papéis tinham-se invertido. Riley sentia a iminente dependência de Bill em relação a ela, logo agora que ela começava a sentir-se livre e suficientemente forte para estar sozinha.
“Fomos bons parceiros,” Disse Riley. Era uma lamechice mas não lhe ocorrera mais nada para dizer.
Bill respirou fundo.
“Foi por isso mesmo que vim ter contigo,” Disse Bill. “O Meredith disse-me que te tinha ligado sobre o caso de Phoenix. Estou a trabalhar nesse caso e preciso de um parceiro.”
Riley sentiu-se ligeiramente irritada. A visita de Bill parecia-lhe agora uma espécie de cilada.
“Eu disse ao Meredith que ia pensar no assunto,” Respondeu Riley.
“E agora sou eu que te estou a pedir,” Continuou Bill.
Instalou-se o silêncio.
“E a Lucy Vargas?” Perguntou Riley.
A Agente Vargas era uma novata que tinha trabalhado com Bill e Riley no seu último caso. Ambos tinham ficado muito impressionados com o seu trabalho.
“O tornozelo dela não sarou,” Disse Bill. “Não pode regressar ao trabalho de campo pelo menos por mais um mês.”
Riley sentiu-se uma idiota por ter perguntado. Quando ela, Bill e Lucy tinham encontrado Eugene Fisk, o “assassino das correntes”, Lucy tinha caído, partido um tornozelo e quase fora morta. Era óbvio que não podia regressar tão cedo ao trabalho.
“Não sei, Bill,” Retomou Riley. “Esta pausa do trabalho tem-me feito muito bem. Estava a pensar em apenas ensinar a partir de agora. Só te posso dizer aquilo que já disse ao Meredith.”
“Que vais pensar no assunto.”
“Exatamente.”
Bill soltou um resmundo de descontentamento.
“Podemos ao menos encontrar-nos e conversar sobre o assunto?” Perguntou Bill. “Talvez amanhã?”
Riley calou-se novamente por alguns segundos.
“Amanhã não,” Disse. “Amanhã tenho que ver um homem morrer.”
Riley olhou pela janela para a sala onde Derrick Caldwell em breve morreria. Estava sentada ao lado de Gail Bassett, a mãe de Kelly Sue Bassett, a última vítima de Caldwell. O homem tinha assassinado cinco mulheres antes de Riley o apanhar.
Riley tinha vacilado antes de aceitar o convite de Gail para assistir à execução. Só tinha visto outra até à data, dessa vez como testemunha voluntária sentada entre jornalistas, advogados, polícias, conselheiros espirituais e o representante do júri. Agora ela e Gail encontravam-se entre nove familiares de mulheres mortas por Caldwell, todos amalgamados num espaço exíguo, sentados em cadeiras de plástico.
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