“E fé,” Acrescentou Doty.
Riley sentiu um estranho arrepio quando ele disse aquilo. Já perdera conta ao número de vezes que ouvira pessoas a dizer que rezavam para que uma pessoa desaparecida aparecesse sã e salva. Mas a fé nunca ajudara.
Fará com que as pessoas se sintam melhor? Interrogou-se.
Não imaginava porquê ou como.
A tarde estava luminosa quando o carro saiu de Des Moines rumo à auto-estrada. Pouco depois, Doty virou para uma estrada de duas faixas que se espraiava pelo campo.
Riley teve uma sensação estranha no estômago. Demorou alguns momentos a perceber que essa sensação não estava relacionada com o caso – pelo menos, não diretamente.
Sentia-se muitas vezes assim quando tinha um trabalho no Midwest. Ela geralmente não sofria de medo de espaços amplos – agorafobia, pensava que se chamava. Mas as vastas planícies e pradarias despoletavam um tipo de ansiedade único nela.
Riley não sabia o que era pior – as planícies planas que vira em estados como o Nebraska, espraiando-se até onde a vista alcança, ou uma pradaria monótonoa como aquela com as mesmas quintas, cidades e campos a surgirem vezes sem conta. De qualquer das formas, considerava aquilo perturbador, até mesmo enjoativo.
Apesar da reputação do Midwest como uma terra de valores Americanos íntegros, de certa forma não a surpreendia que se cometessem homicídios ali. No que lhe dizia respeito, só o campo era suficiente para enlouquecer uma pessoa.
Em parte para afastar a mente da paisagem, Riley pegou no telemóvel para enviar uma mensagem à família.
Cheguei bem.
Pensou por um momento, depois acrescentou…
Já tenho saudades vossas. Mas provavelmente estou de volta num instante.
*
Após cerca de uma hora na auto-estrada de duas faixas, Doty virou para uma estrada de gravilha.
Enquanto prosseguia a condução disse, “Estamos a chegar ao terreno de George Tully.”
Riley olhou à sua volta. A paisagem parecia igual – grandes pedaços de campos vazios interrompidos por regos, vedações e linhas de árvores. Reparou numa casa grande no meio de tudo aquilo, situada ao lado de um celeiro decrépito.Calculou que Tully ali vivesse com a família.
Era uma casa de aspeto estranho que parecia ter sido sujeita a alterações ao longo dos anos, provavelmente por várias gerações.
Entretanto, Riley viu o veículo do médico-legista, estacionado na berma da estrada. Vários outros carros estavam estacionados por perto. Doty estacionou atrás da carrinha do médico-legista e Riley e Jenn seguiram-no e ao seu parceiro mais jovem na direção de um campo recentemente arado.
Riley viu três homens à volta de um local escavado. Não conseguia ver o que ali tinha sido encontrado, mas entreviu um pedaço de tecido colorido a flutuar na brisa primaveril.
Era ali que estava enterrada, Percebeu.
E naquele momento, Riley foi atingida por uma sensação estranha.
E percebeu que ela e Jenn tinham um importante papel a desempenhar ali.
Tinham trabalho a fazer – uma rapariga estava morta e elas não parariam até o assassino ser descoberto.
Duas pessoas estavam junto ao corpo recentemente desenterrado. Riley dirigiu-se de imediato a um delas, um homem musculoso aparentando ter a sua idade.
“Chefe Joseph Sinar, presumo,” Disse ela com a mão em posição de cumprimento.
Ele anuiu e apertou-lhe a mão.
“As pessoas daqui tratam-me por Joe,”
Sinard indicou um homem obeso de aspeto aborrecido na casa dos cinquenta a seu lado, “este é Barry Teague, o médico-legista do condado. Vocês devem ser o pessoal do FBI por que esperávamos.”
Riley e Jenn mostraram os seus distintivos e apresentaram-se.
“Aqui está a nossa vítima,” Disse Sinard.
Apontou para baixo na direção do buraco onde uma jovem repousava descuidadamente com um vestido cor de laranja vivo. O vestido estava levantado acima das coxas e Riley viu que a roupa interior havia sido retirada. Não usava sapatos. O rosto estava anormalmente pálido e a sua boca aberta ainda apresentava vestigios de terra. Os olhos estavam abertos. O corpo sujo apresentava uma cor opaca, já sem traços de vida.
Riley estremeceu. Raramente sentia qualquer emoção ao ver um cadáver – Vira muitos ao longo dos anos. Mas esta rapariga lembrava-lhe muito April.
Riley virou-se para o médico-legista.
“Já chegou a alguma conclusão, Sr. Teague?”
Barry Teague acocorou-se junto ao buraco e Riley juntou-se a ele.
“É mau – muito mau,” Disse ele num tom de voz que não expressava qualquer emoção.
Apontou para as coxas da rapariga.
“Vê estas nódoas negras?” Perguntou ele. “Parece-me que foi violada.”
Riley não o disse, mas pareceu-lhe que tinha razão. A julgar pelo odor, talbém pressupôs que a rapariga tivesse morrido há duas noites e que estaria ali enterrada desde essa altura.
Riley perguntou ao médico-legista, “Qual terá sido a causa da morte?”
Teague soltou um suspiro de impaciência.
“Não sei,” Disse ele. “Talvez se vocês me deixarem retirar o corpo daqui para fazer o meu tarbalho, eu vos consiga dizer.”
Era palpável o ressentimento do homem por ali estar o FBI. Iriam ela e Jenn enfrentar muita resistência local?
Lembrou a si própria que fora o Chefe Sinard a chamá-los. Pelo menos podia contar com a cooperação de Sinard.
Riley disse ao médico-legista, “Já a podem levar.”
Levantou-se e olhou em seu redor. Viu um homem idoso a alguns metros de distância, encostado a um trator e a olhar diretamente para o corpo.
“Quem é aquele?” Perguntou ao Chefe Sinard.
“George Tully,” Disse Sinard.
Riley lembrou-se que George Tully era o dono daquela terra.
Ela e Jenn caminharam na sua direção e apresentaram-se. Tully mal pareceu reparar na sua presença. Não parava de olhar para o corpo enquanto a equipa de Teague se preparava para cuidadosamente o remover do local.
Riley disse-lhe, “Sr. Tully, sei que encontrou a rapariga.”
Ele assentiu monotonamente, sem retirar os olhos do corpo.
Riley disse, “Eu sei que é difícil. Mas poderia contar-me o que aconteceu?”
Tully falou num tom de voz vago e distante.
“Não há muito a dizer. Eu e os rapazes viemos de manhã cedo para semear. Eu reparei em qualquer coisa de estranho na terra aqui. O aspeto incomdou-me por isso comecei a cavar… e então lá estava ela.”
Riley pressentiu que Tully não ia ser capaz de contar muito.
Jenn disse, “Faz ideia de quando é que o corpo possar ter sido enterrado aqui?”
Tully abanou a cabeça silenciosamente.
Riley olhou à sua volta durante um instante. O campo parecia ter sido recentemente arado.
“Quando é que araram este campo?” Perguntou.
“Há dois dias. Não, há três. Íamos começar a semear hohe.”
Riley pensou nisto. Parecia consistente com a sua hipótese de que a rapariga tivesse sido morta e enterrada há duas noites.
Tully falou enquanto continuava a olhar em frente.
“O Chefe Sinard disse-me o seu nome,” Disse ele. “Katy – o seu último nome era Philbin, acho. Estranho, não reconheci esse nome. E também não a reconheci. Já lá vai…”
Parou de falar durante um momento.
“Já lá vai o tempo em que conhecia todas as famílias da cidade e também os seus filhos. Os tempos mudaram.”
Da sua voz sobressaía uma tristeza dolorida e entorpecida.
Agora Riley conseguia sentir a sua dor. Ela tinha a certeza que ele vivera naquela terra toda a sua vida, assim como os pais, os avós e os bisavós, e esperava pasar a quinta aos seus próprios filhos e netos.
Nunca imaginara que algo assim pudesse acontecer ali.
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