Riley ficar-lhe-ia eternamente grata por isso.
Até àquele momento, passara uma noite com Blaine em sua casa. Tinham sido bastante discretos quanto a isso – a sua filha, Crystal, estava fora a visitar os primos nas férias. Riley sorriu ao lembrar-se daquela noite.
Iria esta noite terminar da mesma forma?
*
A empregada de Riley, Gabriela, tinha cozinhado uma deliciosa refeição de chiles rellenos a partir de uma receita de família que trouxera da Guatemala. Toda a gente estava a adorar os pimentos recheados.
Riley sentia-se satisfeita com o maravilhoso jantar e magnífica companhia.
“Não está demasiado picante?” Perguntou Gabriela.
Não estava demasiado condimentado e picante para as papilas gustativas Americanas e Riley tinha a certeza de que Gabriela o sabia. Gabriela sempre tinha cuidado ao preparar aquelas receitas originais. Era óbvio que procurava elogios, e não demoraram muito a surgir.
“Não, está perfeito,” Disse April, a filha de quinze anos de Riley.
“O melhor de sempre,” Disse Jilly, a menina de treze anos que Riley estava a tentar adotar.
“Simplesmente maravilhoso,” Disse Crystal, a melhor amiga de April.
O pai de Crystal, Blaine Hildreth, não disse nada de imediato. Mas Riley percebeu pela sua expressão que estava encantando com o prato. Ela também sabia que a opinião de Blaine era em parte profissional. Blaine era dono de um restaurante ali em Fredericksburg.
“Como é que o faz Gabriela?” Perguntou Blaine depois de algumas dentadas.
“Es un secreto,” Disse Gabriela com um sorriso malicioso.
“Com que então um segredo?” Disse Blaine. “Que tipo de queijo utiliza? Não consigo perceber. Sei que não é Monterey Jack ou Chihuahua. Talvez Manchego?”
Gabriela abanou a cabeça.
“Nunca o direi,” Disse ela com uma risada.
Enquanto Blaine e Gabriela continuaram a discutir sobre a receita, parte em Inglês e parte em Espanhol, Riley deu por si a pensar se ela e Blaine poderiam…
Corou ao ocorrer-lhe a ideia.
Não, não vai acontecer esta noite.
Não poderia haver escapatória graciosa ou discreta com toda a gente ali.
Não que as coisas não estivessem bem como estavam.
Estar rodeada de gente que amava era um enorme prazer. Mas ao observar a sua família e amigos a divertirem-se, uma nova preocupação começou a surgir na mente de Riley.
Havia uma pessoa que mal tinha dito uma palavra à mesa. Era Liam, o mais recente hóspede na casa de Riley. Liam tinha a idade de April e os dois adolescentes tinham namorado a dada altura. Riley tinha salvo o miúdo de um pai agressivo e bêbedo. Ele precisava de um lugar para viver e naquele momento dormia num sofá-cama em casa de Riley.
Geralmente, Liam era falador e sociável. Mas algo parecia estar a incomodá-lo naquela noite.
Riley perguntou, “Passa-se alguma coisa, Liam?”
O rapaz parecia nem sequer a ouvir.
Riley falou um pouco mais alto.
“Liam.”
Liam levantou os olhos da refeição em que mal tinha tocado até ao momento.
“Huh?” Disse ele.
“Passa-se alguma coisa?”
“Não. Porquê?”
Riley não tinha dúvida de que algo estava errado. Liam nunca era parco em palavras como estava a ser.
“Ocorreu-me que se poderia passar algo,” Disse ela.
Tentou não se esquecer que teria que falar com Liam mais tarde.
*
Gabriela terminou a refeição com um delicioso pudim flan. Riley e Blaine tomaram bebidas enquanto os quatro miúdos se entretinham na sala. Por fim, Blaine e a filha foram embora.
Riley esperou até April e Jilly irem dormir. Depois foi sozinha até à sala familiar onde Liam estava sentado no sofá ainda fechado a olhar para o vazio.
“Liam, eu sei que se passa alguma coisa. Gostava que me dissesses o que é.”
“Não se passa nada,” Disse Liam.
Riley cruzou os braços e não disse nada. Ela sabia por experiência própria que às vezes o melhor era esperar.
Então Liam disse, “Não quero falar sobre o assunto.”
Riley ficou alarmada. Estava habituada a alterações de humor adolescente da April e da Jilly, pelo menos de vez em quando. Mas aquilo não era típico de Liam. Ele era sempre agradável e afetuoso. Também era um estudante dedicado e Riley apreciava a influência que ele exercia em April.
Riley continuou à espera em silêncio.
Por fim, Liam disse, “Recebi hoje uma chamada do meu pai.”
Riley sentiu um buraco no estômago.
Não conseguia evitar lembrar-se daquele dia terrível quando fora a casa de Liam para o salvar de ser espancado pelo pai.
Ela sabia que não devia estar surpreendida, mas não sabia o que dizer.
Liam disse, “Ele diz que está arrependido de tudo. Diz que tem saudades minhas.”
A preocupação de Riley aumentou. Ela não tinha qualquer custódia legal sobre Liam. Naquele momento, ela era uma espécie de mãe adotiva improvisada e não fazia ideia de qual seria o seu papel na sua vida futura.
“Ele quer que voltes para casa?” Perguntou Riley.
Liam anuiu.
Riley não conseguia colocar a pergunta mais óbvia…
“O que é que tu queres?”
O que é que ela faria – o que poderia ela fazer – se Liam dissesse que queria regressar a casa?
Riley sabia que Liam era um rapaz carinhoso e com capacidade de perdoar. Tal como muitas vítimas de abusos, também era propenso à negação.
Riley sentou-se a seu lado.
Perguntou, “Tens sido feliz aqui?”
Liam emitiu um som sufocado. Pela primeira vez, Riley apercebeu-se de que ele estava à beira de chorar.
“Oh, sim,” Disse ele. “Tem sido… Eu tenho estado… tão feliz.”
Riley sentiu um nó na garganta. Ela queria dizer-lhe que ele podia ficar o tempo que quisesse. Mas o que poderia ela fazer se o pai exigisse o seu regresso? Ela nada poderia fazer para o impedir.
Uma lágrima correu pelo rosto de Liam.
“É só que… desde que a mãe se foi embora… sou tudo o que o pai tem. Ou pelo menos era até me ir embora. Agora está completamente sozinho. Ele diz que parou de beber. Diz que não me vai magoar nunca mais.”
Riley quase disse…
“Não acredites nele. Nunca acredites nele quando disser isso.”
Mas em vez disso, Riley disse, “Liam, o teu pai está muito doente.”
“Eu sei,” Disse Liam.
“Depende dele obter a ajuda de que precisa. Mas até a obter… bem, será muito difícil ele mudar.”
Riley não disse mais nada durante alguns momentos.
Depois acrescentou, “Lembra-te sempre que a culpa não é tua. Sabes disso, não sabes?”
Liam engoliu um soluço e anuiu.
“Voltaste a vê-lo?” Perguntou Riley.
Liam abanou a cabeça em silêncio.
Riley deu-lhe uma palmadinha na mão.
“Só quero que me prometas uma coisa. Se fores vê-lo. Não vás sozinho. Quero estar lá contigo. Prometes?”
“Prometo,” Disse Liam.
Riley pegou numa caixa de lenços e deu um a Liam que limpou os olhos e assoou o nariz. Depois os dois ficaram sentados em silêncio durante algum tempo.
Por fim, Riley disse, “Precisas de mim para mais alguma coisa?”
“Não. Agora estou bem. Obrigado por… bem, você sabe.”
E sorriu-lhe muito ligeiramente.
“Por tudo,” Acrescentou ele.
“Não tens de quê,” Disse Riley, devolvendo-lhe o sorriso.
Ela saiu da sala familiar, caminhou até à sala de estar e sentou-se sozinha no sofá.
De repente, foi acometida por uma emoção tão grande que não conseguiu evitar chorar. Ficou alarmada por perceber como ficara abalada com a conversa que acabara de ter com Liam.
Mas quando pensou nisso, foi fácil perceber porquê.
Estou tão desnorteada, Pensou.
No final de contas, ainda estava a tratar da adoção de Jilly. Salvara a pobre rapariga de horrores inomináveis. Quando Riley a encontrou, Jilly estava a tentar vender o corpo por puro desespero.
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